O tema central do livro X da Ética a Nicômaco é a felicidade, bem supremo procurado por todos os homens.
      A experimentação da virtude, segundo o Estagirita, pode-se dar pelo prazer. Para se ter uma vida feliz, os homens escolhem o que lhes é agradável e evitam a dor. O prazer é parte da natureza humana:

Porque essas coisas nos acompanham durante a vida inteira, com um peso e um poder próprios tanto no que toca a virtude como à vida feliz, já que os homens escolhem o que é agradável e evitam o que é doloroso; e são elas, segundo parece, as que menos conviria omitir em nossa investigação, especialmente por serem objeto de muitas controvérsias. (Aristóteles, 1987, p. 179).

      A felicidade é atingida quando o homem se liberta dos males terrestres, mas não pode ser contínua. Por isso, é preciso ser virtuoso e respeitar os valores morais.
      Diz Aristóteles que; o prazer é o sentimento que guia os jovens. Comprazer–se das coisas apropriadas e desprezar as más tem fundamental importância na formação do caráter. Diz ele (Ibdid., p.79) que; Eudoxo acreditava que o prazer é um bem, pois todos os animais buscam a ele ao contrário da felicidade da qual os animais não participam: “…Nenhum dos outros animais é feliz, uma vez que de nenhum modo participam eles da contemplação” (Ibid., p. 191). Segundo ele, o prazer quando buscado em razão de um outro bem (como a justiça), torna–se mais digno ainda, confirmando a idéia de que o bem só pode ser acrescido pelo bem.
      Considera-se ainda, que o prazer é indeterminado, pois, admite-se uma graduação, e o bem a que procuramos não, ele é determinado: “Dizem, no entanto, que o bem é determinado, enquanto o prazer é indeterminado, visto admitir graus” (Ibid., p. 181).O prazer acompanha a “vida ativa” e, por isso, não o sentimos continuamente. Algumas coisas nos são prazerosas quando novidades, e nem tanto quando deixam de ser. Isso se dá por causa da estimulação espiritual. De início, prestamos mais atenção a algo e depois, com nossa atividade menos intensa, já não mais prestamos tanto como antes.
      O Estagirita afirma ainda que o prazer complementa as atividades, tornando a vida completa. Estando os dois (prazer e vida) intimamente ligados, ele difere em várias espécies, por ocorrer sua divisão de acordo com a atividade que este complementa e intensifica. Cada atividade que é realizada com prazer é feita da melhor maneira possível. Assim, alguém que tenha prazer em estudar geometria, por exemplo, fará mais descobertas e entenderá melhor o assunto por ter nele afinidade e prazer. Diz Aristóteles que; quando nos comprazemos demais em uma determinada atividade, nos dedicamos demasiadamente a ela e não servimos a mais nenhuma outra. Sempre evitamos fazer aquilo que nos é penoso.
Segundo Aristóteles, estes conceitos sobre o que é prazeroso e o que é penoso, variam de pessoa para pessoa. Pois, o que é quente para um homem fraco pode não o ser para um forte:

Ou talvez os prazeres difiram em espécie, pois os que provém de fontes nobres são diferentes daqueles cujas fontes são vis, e não se pode sentir o prazer do homem justo sem ser justo, nem os prazeres do músico sem ser músico, e assim por diante. (Ibid., p.182)

      Diz Aristóteles que, a felicidade é o fim que natureza humana visa. E, a felicidade é uma atividade, pois não está acessível àqueles que passam sua vida adormecidos. Ela não é uma disposição. À felicidade nada falta, ela é completamente auto-suficiente. É uma atividade que não visa a mais nada a não ser a si mesma. O homem feliz, basta a si mesmo. Uma vida virtuosa exige esforço e não consiste em divertimento. Portanto, a recreação não consiste em felicidade. Por isso, conclui o filósofo que; a boa atividade na virtude torna–se felicidade. Porém, para por em prática os atos justos e bons são necessárias outras coisas. Por exemplo: um homem liberal necessitará de dinheiro para por em prática seus atos. Por isso, segundo Aristóteles, devemos questionar o que é melhor: a vontade ou a ação? Pois, quanto mais nobres e justos forem os atos mais coisas serão necessárias para sua realização. Temos então que, segundo o filósofo, a contemplação é a melhor das atividades, pois, para ela ser realizada não necessitamos de mais nada. Por isso, podemos concluir que os animais incapazes (seres não racionais) não participam da felicidade total, pois, são privados desta atividade (taumazen) e as pessoas que mais são capazes de realizá–la são as mais felizes. Segundo Aristóteles, homem para ser feliz precisa também de bens exteriores (bens materiais), pois, nossa natureza não basta a si mesma, embora estes itens não devam ser, necessariamente, muitos ou grandes, diz ele, mas sim como Sólon os colocou, dizendo que; o homem deve ser moderadamente provido de bens exteriores:

O homem liberal necessita de dinheiro para a prática de seus atos de liberalidade e o homem justo para a retribuição de serviços de serviços (pois é difícil enxergar claro nos desejos, e mesmo os que não são justos aparentam o desejo de agir com justiça); e o homem corajoso necessita de poder para realizar qualquer dos atos que correspondem à sua virtude, e o temperante necessita de oportunidade… (Ibid., p.190).

      Sobre o homem feliz, diz o Estagirita:

…necessita de prosperidade exterior, porquanto a nossa natureza não basta a si mesma para os fins de contemplação: nosso corpo também precisa de gozar saúde, de ser alimentado e cuidado. Não se pense, todavia, que o homem para ser feliz necessite de muitas ou de grandes coisas, só porque não pode ser supremamente feliz sem bens exteriores. (Ibid., p.191).

      Vemos o meio termo na questão da felicidade também. Diz o autor que, alguns pensam que; por natureza nos tornamos bons. Outros acreditam que é pelo hábito, e outro pelo ensino. Mas, quanto a natureza, não depende de nós, ela se dá em decorrência da vontade divina, e pelo ensino. Alguém que vai aprender deve estar preparado para tal, tornando–se capaz de gostar ou sentir aversão de maneira correta através do hábito.
      Para Aristóteles, fazer com que as pessoas ajam da maneira correta desde a infância é uma tarefa árdua. Sendo assim, devem existir leis definindo como deve ser educação dos jovens. Leis que devem vigorar também para os adultos. Pois, a maioria das pessoas age certo mais por medo do castigo do que pelo gosto à nobreza. Nosso autor demonstra como deve ser a educação dos jovens:

Mas é difícil receber desde a juventude um adestramento correto para a virtude quando não nos criamos debaixo das leis apropriadas (…).Por essa razão, tanto a maneira de criá-los como as suas ocupações deveriam ser fixadas pela lei; pois essas coisas deixam de ser penosas quando se tornam habituais (Ibid., p.193).

      Somente quando o homem tem um raciocínio que vise a honra o legislador deve agir de maneira diferente, deixando o poder coercitivo, o que raramente pode ocorrer. Pois, segundo o pensador, a maioria das pessoas não pensa assim. Portanto, o legislador deve continuar com este papel importante e para executá-lo, ele deve ter uma visão universal do que é ético para a boa conduta da vida. Eis o contexto da pólis na ética aristotélica.
      O homem mais feliz é aquele em que tais atributos estão presentes. E mais do ninguém o filósofo é aquele que os possui, sendo assim, no pensamento aristotélico, tal homem é caro aos deuses e consequentemente o mais feliz dos homens:

Ora, é evidente que todos esses atributos pertencem mais que a ninguém ao filósofo. É ele, por conseguinte, de todos os homens o mais caro aos deuses. E será, presumivelmente, também o mais feliz. De sorte que também neste sentido o filósofo será o mais feliz dos homens. (Ibid., p. 192).

      A felicidade é atingida quando o homem se liberta dos males terrestres, mas não pode ser contínua. Por isso, é preciso ser virtuoso e respeitar os valores morais.


Bernardo Rafael de Carvalho Pereira
Segundo Período de Filosofia