Faz-se aqui a resenha de uma palestra sua proferida por Umberto Eco na Biblioteca de Alexandria, no Egito. Umberto Eco é autor de numerosos livros, entre eles O Nome da Rosa, famoso clássico levado às telas tendo a participação de Sean Conorey.
Eco inicia seu discurso falando sobre os três tipos de memória: a orgânica, a mineral e a vegetal. Esta última é representada pelos livros impressos, sendo que as bibliotecas são o templo dessa memória. Colocando o espaço da biblioteca como que uma imitação da mente de Deus, que tudo sabe, Eco rebate a ideia de “morte dos livros” e das bibliotecas como museus.

Questionado sobre a possibilidade da extinção dos livros impressos devido à expansão da Internet, o autor não vê perigo. Segundo ele, o medo de a escrita acabar com a memória remonta a Platão, mas não se confirmou na prática: para se trabalhar com os livros é necessária a memória, sendo uma forma de avivá-la. Os livros provocam outros pensamentos e não os substitui. Do mesmo modo, hoje há o medo de que o computador suplante os livros, mas isso igualmente se verificará como falso.
A Internet, contudo, se apresenta não como uma ferramenta linear de leitura, mas como uma “galáxia” na qual os textos se conectam de forma multidimensional. O universo hipertextual oferece múltiplas opções de leitura interligada. Há livros de leitura “corrida” e livros de consulta, sendo que a Internet é uma combinação de ambos, de modo que as facilidades que oferece nos permitem economizar tempo e esforço. Manuais e enciclopédias impressos devem ficar obsoletos, de acordo com Eco, isso devido às facilidades da Internet e do CD-Rom.
Os livros de leitura, porém, não desaparecerão, sobretudo quando se precisa ler com cuidado e refletir sobre os conteúdos. Para Eco, se por um lado os computadores proporcionam uma nova forma de letramento, por outro, não satisfazem a todas as necessidades do intelecto humano. Além disso, os livros têm durabilidade e resistência física maior e mais baixo custo.
Segundo Eco, as novas invenções não necessariamente eliminam as antigas, de modo que mesmo que as livrarias deixem de existir, os livros impressos continuarão. Nem o livro eletrônico será capaz de eliminar o impresso, mas talvez melhorá-lo.
Outro ponto abordado pelo autor é a finitude real do livro e a infinitude virtual do hipertexto e seu papel na interpretação: limitados pelo sistema lingüístico e físico, são ilimitados dentro das possibilidades proporcionadas pela múltipla conexão em rede e pela variegada possibilidade de interpretação que o meio oferece. O texto em si é finito, pois reduz as possibilidades infinitas do sistema lingüístico a um mundo fechado. Se por um lado as interpretações possíveis são muitas, elas não vão ao infinito, nem extrapolam os limites da plausibilidade.
A hipertextualidade também possibilita a interatividade e, talvez, nisto esteja a possibilidade da transformação do texto em algo dinâmico, fora dos limites físicos. Mas aí reside o problema da autoria: quem é o autor de um texto construído por milhares de “anônimos”? Isso, contudo não é novo: para Eco, o item improviso (intimamente ligado ao contexto) não foi motivo, por exemplo, para o fim do teatro nos tempos da Commedia dell’arte, ou uma apresentação de jazz. Em suma, para o autor, a autoria também não está condenada ao desaparecimento, mas, antes, haverá a convivência d liberdade hipertextual com a limitação do texto fechado. O texto fechado é o suporte da instrução e permite que o leitor aceda à sabedoria. Nas palavras de Eco: “sua lição repressiva é indispensável para alcançarmos uma condição mais elevada de liberdade intelectual e moral”.


Benedito Fernando Pereira
Licenciado em Letras (Univás), Bacharel em Filosofia (FACAPA), graduando em História (Univás) e pós-graduando em Ensino de Filosofia (FACAPA).

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

ECO, Umberto. Muito além da Internet. Folha de São Paulo. Caderno Mais. p. 4-10, 14 de dezembro de 2003.